quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

liberdade I

LIBERDADE
Liberdade é um sentimento. Um indivíduo encarcerado nas mais restritivas condições, pode sentir-se mais livre que alguém que não tenha nenhum compromisso e em condição de fazer qualquer coisa.

A lei Áurea deve ter provocado um grande sentimento de liberdade em muitos negros. Grande parte deve ter saído correndo das senzalas assim que as portas foram abertas, passando pelas porteiras das fazendas como passarinhos que deixam as gaiolas em que estiveram presos, sentindo-se livres, donos de si mesmos e de seu futuro.
A grande maioria nascera nas senzalas e não tinha a menor idéia do que era necessário para assumir a responsabilidade pela própria vida. Alimento, vestuário, moradia, saúde; até ali, tinham sido responsabilidade de seus donos.
A propaganda anti-escravista tinha razão quando acusava a exploração dos negros, que só custavam a manutenção e mais nada, propiciando grandes lucros aos patrões. Com a força de seu trabalho, poderiam pagar pela sua subsistência e conseguir melhorias, progredindo e acumulando.
Em teoria isso era verdade. Se tivessem terra e a trabalhassem como o faziam para os patrões; a administrassem como estes o faziam, comercializassem, tanto os insumos como a produção, com os mesmos critérios; alcançariam os mesmos benefícios conseguidos pelos que os tinham explorado por tanto tempo. Tendo consciência de que trabalhavam para si, poderiam produzir mais e melhor, aumentando a produtividade e desfrutando de maiores benefícios. Afinal, se eles eram os responsáveis pela riqueza dos patrões, seria lógico que obtivessem os resultados que propiciavam.
No entanto, não tinham terra, nem insumos, nem ferramentas. Não sabiam comercializar, nem trapacear, nem explorar. Não tinham consciência da força da união, da solidariedade, do que o esforço coletivo poderia propiciar a cada um. Acreditaram-se livres, como indivíduos e, muitos, devem ter considerado que qualquer tipo de associação restringiria essa liberdade. Partiram para desfrutar a tal liberdade, individualmente, acreditando que nada poderia ser pior do que a vida levada até ali.
Logo ficou evidente que a força de trabalho sem organização e, principalmente, sem capacidade de comercialização; vale muito pouco. A grande maioria constatou que o rendimento de seu trabalho não propiciava nem o mínimo do que desfrutavam na senzala. Sendo propriedade, mereciam um mínimo de atenção para que mantivessem seu valor. Agora, eram descartáveis. Continuavam sendo explorados, mas quando tinham algum problema, eram substituídos e abandonados à própria sorte.
O sentimento de liberdade, sentido quando da abertura das sensalas, deu lugar à constatação de que se haviam tornado em escravos da própria sorte. Deve ter sido triste perceber que se, antes, só tinham valor como escravos; agora, não tinham valor nenhum.

Nenhum comentário: